Com 84 anos de atividades ininterruptas a Companhia Industrial Cataguases, uma das maiores empresas têxteis do Brasil, prepara-se para um futuro colaborativo. Fundada em 1936 ela tem se destacado no mercado nacional, passando por todas as intempéries econômicas que o Brasil enfrentou durante essas oito décadas. Hoje, em meio à pandemia, a Companhia Industrial se mantém ativa e se reinventando. Tiago Inácio Peixoto, diretor comercial e porta-voz da empresa, falou ao site FashionUnited sobre esta nova fase da fábrica de tecidos que se confunde com a história de Cataguases.
A FashionUnited é uma plataforma independente que visa informar e compartilhar informações com a indústria da moda internacional, incluindo profissionais da área, mídia e seguidores dedicados da indústria da moda. O Site do Marcelo Lopes destacou os principais trechos desta entrevista de Tiago Peixoto atual diretor comercial e de marketing daquela empresa, que tem por objetivo digitalizar a Companhia Industrial Cataguases tornando-a ainda mais próxima de seus consumidores. A Industrial tem entre seus clientes grandes redes como Renner e Riachuelo, entre outras.
FashionUnited: Como a empresa se manteve durante essas oito décadas, enfrentando diversos problemas econômicos?
Tiago Peixoto: Não podemos negar que foi necessário muito trabalho, muita luta, muita perseverança, muita resiliência para nos manter, mesmo porque não existe outra receita. Sempre estamos atentos ao movimento de mercado, realizando investimentos para nos manter competitivos e esperamos continuar com essa mesma postura, para escrever outros novos 100 anos de história (a empresa surgiu de uma dissidência da Indústria Irmãos Peixoto, inaugurada em 1911 e, décadas depois, incorporada pela Industrial).
Como a Cataguases tem atuado durante esses meses de pandemia? Sua linha de produção continuou igual ou houve redução?
No segundo trimestre – em abril e maio – interrompemos as atividades e colocamos os colaboradores em quarentena. Infelizmente tivemos que demitir 15 por cento do quadro de funcionários em nossas plantas. Só a partir de junho, conseguimos voltar ao nível de 70 por cento da capacidade de produção, mas nosso estoque estava mais alto do que o ideal, por isso decidimos manter a jornada reduzida até o final de 2020 e só devemos retomar o expediente normal a partir de janeiro de 2021. Também fizemos uma revisão de nosso portfólio, reduzimos 70 percentuais do número de SKUs (unidade de manutenção de estoque), para garantir uma produtividade e eficiência de custos diante de uma redução tão drástica de produção.
Em abril e maio, lançamos a iniciativa de vender máscaras, não só o tecido para produção de máscaras, mas atuamos na confecção, por meio da nossa estrutura, mobilizando rapidamente parceiros de confecções, que prestam serviços para nós, na produção dessas máscaras. Com isso, abrimos um canal de comercialização com clientes corporativos, que não são usualmente clientes da Cataguases (Grupo Energisa, Santander, Braskem, Grupo Pão de Açúcar, Localiza, entre outros) sendo que comercializamos um total de quase 3 milhões de máscaras.
A empresa tem sentido falta de insumos como algodão?
Algodão não, mas corantes e pigmentos utilizados nas estamparias e tinturarias. Não afetou diretamente nossa produção e nossas vendas, pois fazemos pedidos programados de, no mínimo, 3 meses. Nossa equipe de compras também agiu rápido com a equipe de planejamento, evitando assim os impactos na produção. Felizmente, nós, como uma empresa mais verticalizada, não sofremos com isso, pois compramos a pluma do algodão e não o fio. Tivemos sim, um impacto na parte de embalagens, a falta de insumo não foi percebida apenas na cadeia têxtil, mas em várias outras cadeias industriais e de suprimentos.
Para minimizar o impacto no segmento, disponibilizamos nossa planta de fiação – normalmente utilizada para atender nossa demanda interna de fio, destinada para nossa tecelagem – para uma parcela dessa produção para venda de fio ao mercado. Em pouco tempo participamos em diversas frentes, por meio da racionalização do nosso portfólio, da produção de máscaras, da adoção do tecido antiviral e até da comercialização de fios. Tudo isso faz parte de um processo de constante leitura do mercado, de reinvenção, de tomada de decisão muito ágil e assertiva, para poder capturar as oportunidades que surgiam e garantir a sobrevivência do nosso negócio.
O ano de 2020 foi um ano muito desafiador e, principalmente, de aprendizado, notamos que com esforço e com alinhamento, conseguimos tomar decisões eficientes para garantir a sustentabilidade da companhia. Diante do nosso prognóstico, do que poderia ser esse ano, com desafios que a pandemia trouxe, posso dizer que o saldo é positivo para a Cataguases.
O tecido antiviral desenvolvido pela Cataguases tem que tipo de tratamento? É um tratamento no fio ou no tecido plano já pronto?
O tecido antiviral da Cataguases foi possível mediante uma estratégia de colaboração com a Dalila Têxtil, indústria de malharia que criou a tecnologia, e a partir dessa collab inédita no setor têxtil nacional, iniciamos o processo de aplicação do acabamento antiviral em nossos tecidos planos destinados à confecção de máscaras e uniformes. O tecido antiviral tem tido grande apelo de mercado devido à pandemia, mas também oferece outras funcionalidades como antiodor e antibacteriano.
O desenvolvimento começou em meados de abril, depois de muitos testes e estudos, a Dalila Têxtil chegou a uma fórmula líquida de produto, a partir da mistura de um composto de íons de prata com estabilizante natural, que tem ação física e química, que quebra a camada de gordura que envolve o vírus, inativando-o e impedindo a sua proliferação. Os resultados apresentaram alta eficiência contra o coronavírus, de 99,9 percentuais de inatividade em um minuto de contato, e a proteção se estende por, no mínimo, 50 lavagens. O aspecto visual, assim como o toque macio do algodão, não sofre nenhum tipo de alteração ao receber esse acabamento. Para garantir a aplicação da tecnologia em qualquer base de tecido, as empresas optaram pelo acabamento ao invés da aplicação permanente da tecnologia diretamente no fio, explorando a versatilidade do produto para entregas 100 por cento sustentáveis.
A sustentabilidade tem sido bastante discutida e a Cataguases tem vários selos internacionais. Desde quando a empresa atua para ser exemplo nesse quesito? As certificações foram obtidas quando?
Com a pandemia, o movimento de sustentabilidade ganhou ainda mais força, o consumidor está cada vez mais consciente e vai exigir muito mais do que o preço na hora da decisão de compra, por isso, vamos continuar aproximando a marca Cataguases dos nossos clientes, evidenciando a sustentabilidade do nosso negócio. Nossos tecidos de algodão possuem duas certificações reconhecidas internacionalmente; o Standard 100 by Oeko-Tex e BCI (Better Cotton Initiative), ambas desde 2018, que exige o modo de produção sustentável do algodão, sem agressão ao solo e por meio de relações de trabalho sadias. São essas práticas sustentáveis que precisam ser melhor divulgadas pela empresa, para que o consumidor possa identificar quem realmente atua de forma correta no mercado, evitando a competição desleal com produtos importados de baixo custo, que não respeitam o meio ambiente e praticam abuso de mão de obra. Esse é um tema muito relevante e claro para a Cataguases.
Há pelo menos 20 anos, a empresa é pioneira em sustentabilidade. Temos uma matriz que é mantida em três pilares diferentes: produtos, processos e responsabilidade social. Em produtos temos toda uma linha sustentável, com algodão orgânico, algodão, fios e resíduos reaproveitados em nosso processo de fabricação. Pensamos em investir cada vez mais nessa linha, exatamente conectada com a demanda do cliente final. O segundo pilar é de processos, que tem à frente o nosso diretor industrial, Marcos Aurélio Sousa Rodrigues, que garante que os processos de fabricação sigam os critérios de sustentabilidade, desde lâmpadas de LED à racionalização do uso da água – hoje temos uma estação de tratamento de primeira linha, com retorno da água que a gente capta do rio, em melhores condições do que a água que a gente captou. O terceiro pilar, de responsabilidade social, que é um braço da Cataguases desde 1999, com o Instituto Chica (Instituto Francisca de Souza Peixoto), onde temos diversos projetos, com colaboradores, com famílias dos colaboradores e, também, projetos de empoderamento feminino. Isso sem contar que a companhia tem uma relação muito próxima, e quase umbilical, com a comunidade de Cataguases.
Como a empresa está projetando 2021?
Estamos olhando para 2021 e adiante de uma forma cautelosa, mas positiva em relação à retomada do consumo. Vamos observar como vai se comportar essa segunda onda da pandemia no Brasil. Estamos construindo nosso futuro aqui, muito voltado para essa revolução digital, acelerada pela pandemia. As pessoas realmente estão ressignificando a forma de viver, ficando mais tempo em casa, descobrindo que é possível trabalhar e consumir na frente do computador, e estamos bastante atentos a isso, para adaptar o nosso modelo de negócio para poder servir a esse mercado que está em constante transformação. Acreditamos muito na questão da sustentabilidade, como algo que vai vir cada vez mais forte. Os empresários e gestores realmente precisam lançar um olhar especial para esse tema. Por fim, algo que eu, particularmente, acredito muito é que a vamos continuar investindo, nessas colaborações, o mundo está mais aberto, e mais propício para esse tipo de colaboração e, também, para as empresas se abrirem em busca de atuações mais integradas e coordenadas com outras empresas, trocando expertises e conhecimento.
Fonte: FashionUnited | Fotos: Cortesia Industrial Cataguases