Associado ao universo feminino, o vestido de noiva é a força que costura significados no projeto fotográfico "Imaculados", do fotógrafo mineiro Rafael Aguiar. Há um ano, ele retrata homens nus como modelos vestindo ou interagindo com a peça. Até agora, já foram feitos nove registros em Cataguases, cidade natal de Rafael, e em Juiz de Fora.

"É um vestido, uma peça, como poderia ser uma blusa, uma calça. Só que ele [o vestido] carrega um histórico, uma energia muito grande em relação ao papel da mulher na sociedade e o papel de noiva, inclusive. Ao trazer isso para o homem tem um peso também. Ele veste tudo que a mulher veste quando coloca o vestido", explicou o fotógrafo.

De acordo com Rafael, a meta é encerrar com 12 ensaios e os próximos dois já estão com modelos e cenários escolhidos, em Juiz de Fora e Cataguases. As fotos realizadas e já tratadas até agora foram disponibilizadas na fanpage do projeto em uma rede social, que soma mais 1.400 visualizações. E devem ter novos desdobramentos. "Farei um calendário com as fotos e penso também em uma exposição. Há alguns outros projetos, mas ainda não tão viáveis quanto estes dois", disse

De acordo com o fotógrafo, a ideia era buscar traduzir liberdade, entender sentimentos, trabalhar sensações sem se preocupar com as amarras do convencional. No início, a proposta era registrar os homens nus só com elementos do universo feminino. No primeiro ensaio, uma mudança de rumo e a ampliação da proposta.

"A ideia era usar elementos de noiva, como o véu e, às vezes, o buquê, mas não tinha pensado no vestido em si. No primeiro ensaio, ganhamos um vestido. Resolvemos fotografar e o resultado ficou muito surpreendente, inclusive para mim. A questão do universo feminino sempre esteve presente na minha vida e de alguma maneira eu quis trazer para os homens", contou Rafael Aguiar.

A inclusão do vestido como parte do ensaio obrigou o fotógrafo a reorganizar o próprio processo criativo. "Quando você fala que são homens vestidos de noiva causa uma estranheza porque as pessoas não conseguem imaginar o resultado. Até para mim, nos primeiros ensaios, precisei de um tempo para deixar mais harmônico e aquilo fazer parte do meu arquivo visual", falou.

As reações dos homens convidados para posar como modelos também surpreendeu o fotógrafo, pela disponibilidade em participar da proposta.

"A resistência é menor do que eu imaginava. Há algumas pessoas que não topam porque não estão no perfil, porque não trabalham com fotografia ou imagem, têm uma estranheza. Os homens aceitam muito bem a questão de colocar o vestido. Até pelo que o projeto propõe que é diferente de um homem vestido de mulher. Não altera o gênero. Ele continua homem, mas com um adereço do universo feminino", destacou.

O universitário Igor Pires posou nesta semana, em Juiz de Fora. Segundo ele, permitiu repensar os papeis sociais e a liberdade de ser quem quiser. 

"É um paradoxo total. Uma coisa que a gente não costuma ver. Até hoje ainda é um certo tabu um homem vestir peças femininas. Também acaba ajudando ao movimento da liberdade de gênero, da liberdade de usar o que quiser, ser quem quiser independentemente de gênero ou escolha", ressaltou.

O fotógrafo concordou com esta análise, destacando que as possibilidades de significados são ampliadas dentro do contexto de questionamento de rótulos sociais.

"A gente vive uma transformação, eu acredito, positiva na igualdade dos gêneros e na neutralidade também de cada um poder se vestir como quiser e de ter a vida da maneira que acredita que seja melhor para ele. Essas fotos, para mim, podem contribuir em relação a isso. Da pessoa ver, se encantar com o projeto e começar a ver a beleza nas fotografias e como o vestido entra no corpo do homem, enfim, várias interpretações", disse.

Após a experiência de um projeto anterior, Rafael Aguiar (foto) decidiu que os ensaios seriam expostos na internet e criou uma fanpage. Diante do retorno de quem conheceu e viu as fotos, ele considera positivo o resultado até agora.

"A gente teve todo tipo de opinião em relação a ele. Muita gente gostou. É surpreendente. Senhoras vieram elogiar, pessoas de várias partes do país mandam mensagens falando que gostam. Mas às vezes a gente vê uns comentários de quem não entendeu a proposta ou que ainda não conseguiu se familiarizar com a imagem, mas o saldo é positivo", ressaltou.

As fotos na "galeria virtual" também estão ampliando as fronteiras do fotógrafo e permitindo intercâmbio com outros profissionais.

"Graças à internet que a gente consegue alcançar varias pessoas. Recebo mensagens de gente que jamais conheceriam meu trabalho se não fosse a internet. Também troco ideia com outros fotógrafos, com pessoas que gostam do trabalho conceitual, uma interação muito grande", ressaltou.

Entre as pessoas que já viram e curtiram o "Imaculados" está a artista plástica Mariana Procópio, que quis ajudar nos ensaios. "O Rafael já ressignificou tendo a ideia. Agora o público vai ressignificar vendo as fotos. E é assim que as certezas e paradigmas vão mudando", analisou.