Receio é de que a transposição das águas leve as cidades da região à restrição do consumo ou até mesmo à escassez de água
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Participantes da audiência pública da Comissão Extraordinária das Águas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada em Muriaé (Zona da Mata) nesta quarta-feira (7/5/14) temem que a transposição do Rio Paraíba do Sul para o Sistema Cantareira, que abastece a Região Metropolitana de São Paulo, leve à restrição do consumo ou até mesmo à escassez de água na região. O alerta foi feito em reunião que discutiu o pedido de autorização do governo paulista para realizar a obra. O debate foi solicitado pelo deputado Pompílio Canavez (PT).
De acordo com o parlamentar, a solicitação do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, causa apreensão e exige de Minas Gerais a realização de estudos consistentes sobre as consequências a médio e longo prazo dessa transposição. "Infelizmente o consumo irracional, a poluição dos rios e os sucessivos erros de gestão dos recursos hídricos nos colocaram em situação de escassez. O Paraíba do Sul já se encontra em baixa por causa da estiagem. E mesmo diante deste cenário, o Estado de São Paulo está pleiteando resolver sua crise hídrica com nossas águas", salientou.
Segundo o deputado, o próprio Geraldo Alckimin informou que são desperdiçados cerca de 40% do volume de água do Sistema Cantareira devido a falhas na rede de distribuição, sendo que o reservatório está operando com apenas 9,8% de sua capacidade. É o pior nível registrado desde 1984, quando começaram as medições da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). Ele afirmou ainda que o governo paulista pretende abastecer cerca de 2 milhões de habitantes coma água a ser captada no Rio Paraíba do Sul.
Já para Adellunar Marge, representante da Prefeitura de Muriaé, Minas Gerais deve "socorrer" São Paulo. Conforme ela, a medida deve ser pensada com cautela. "Contudo, não podemos deixar que outros brasileiros sejam penalizados pela ausência de água", defendeu.
Por sua vez, o secretário executivo da Bacia do Rio Muriaé, Antônio José Francisco, afirmou que não deseja que os dois Estados entrem em conflito, mas adverte que a retirada de água no Rio Paraíba do Sul vai causar impactos nos demais rios da região, tais como o Muriaé, o Pomba, o Carangola, entre outros. "Temos que saber precisamente quantos metros cúbicos de água cada rio vai baixar. Não é certo penalizar a lavoura, a indústria e os cidadãos mineiros em prol do abastecimento de São Paulo", afirmou.
Falta de planejamento é motivo de crise hídrica
Na visão dos participantes da reunião, a falta de planejamento de sucessivos governos paulistas, ao longo de décadas, é uma das principais causas da crise. Maria Aparecida Borges Pimentel Vargas (foto ao lado), presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica dos Afluentes Mineiros dos Rios Pomba e Muriaé, explicou que o Brasil vive dois extremos - o de seca e o de cheia -, e que o Rio Paraíba do Sul está mais próximo do primeiro panorama. De acordo com ela, essa bacia já abastece 5 milhões de pessoas em Minas Gerais, e a Sabesp já utiliza recursos de outro rio mineiro, o Piracicaba. "A vigência dessa autorização está vencendo, os agentes públicos de São Paulo tiveram dez anos para repensar o sistema e corrigi-lo. Agora que vão perder essa outorga, querem se valer do Rio Paraíba do Sul", destacou.
Ela explicou também que técnicos paulistas apresentaram dez alternativas para reverter o cenário de exaustão do Sistema Cantareira, e a transposição do Paraíba do Sul foi considerada uma das últimas opções. No entanto, por ser a medida que demandaria menos tempo para ser concretizada, foi logo colocada em negociação com o governo mineiro. Maria Aparecida Vargas alertou, porém, que a obra resolveria o problema de abastecimento de São Paulo por, no máximo, 20 anos. "Para a crescente população paulista, isso significa optar por uma medida paliativa e que poderá trazer não só perda de recursos hídricos para Minas como também redução do nosso potencial energético", alertou.
Para o promotor de Justiça Bruno Guerra de Oliveira, São Paulo quer apenas "apagar um incêndio". "E apagar incêndio não faz parte de um processo de planejamento", criticou. Ele acrescentou que questões políticas e partidárias devem ser deixadas de lado.
Igam prepara parecer técnico
Eduardo de Araújo Rodrigues, coordenador do Núcleo Regional do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) em Juiz de Fora, disse que o Estado ainda não se manifestou sobre a solicitação do governo paulista em função de mudanças na gestão do órgão. Ele informou, contudo, que o Igam pretende apresentar um parecer o mais rápido possível. Alertou ainda que se Minas não recuperar suas nascentes, encostas e margens de rios, vai vivenciar o mesmo problema de São Paulo. "Temos considerável volume de recursos hídricos, mas nossa capacidade de armazenamento de água é insuficiente diante de grandes períodos de estiagem", afirmou.
Quanto à baixa em rios da região caso seja feita a transposição, ele afirmou que rios como o Muriaé, na verdade, fornecem água para o Paraíba do Sul. "Sendo assim, não haveria alteração no abastecimento propiciado por esses rios, com a captação de água no Paraíba". No entanto, o deputado Pompílio Canavez ponderou que já há conflitos por água na região e que a medida pode reduzir ainda mais, ao longo dos anos, a capacidade de emitir outorgas e demais autorizações de captação e uso dos recursos hídricos na Zona da Mata. (Fotos: Ricardo Barbosa/ALMG)
- Foto: Ricardo Barbosa
Maria Aparecida Vargas explicou que a transposição de águas não é uma das melhores opções, porém demanda menos tempo - Foto: Ricardo Barbosa
Debates – O público presente também se manifestou e cobrou que a discussão seja ampliada para um número maior de cidadãos, sobretudo aqueles que podem ser futuramente prejudicados com a transposição. Os participantes da reunião ainda puderam registrar testemunhos de moradores locais e vereadores sobre episódios de escassez de água na região. Também expuseram preocupação sobre o caráter político que a decisão pode tomar.
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