Em 21/11/2012 às 18h12 | Atualizado em 27/07/2018 às 17h22
Agência Brasil
São Gabriel da Cachoeira - Puranga pesika, atiati muhsã ematsia yokawa, saudações em diferentes línguas indígenas e que significam bom dia, são comuns em São Gabriel da Cachoeira, no estado do Amazonas. Com mais de 90% da população constituída por índios de 23 etnias, o município abriu a Campanha Nacional pela Certidão de Nascimento e Documentação Básica, lançada ontem (20).
O município foi escolhido pela diversidade de populações indígenas e por ter uma taxa alta de subregistros de nascimentos, calculada em 32%. O lançamento teve a participação da ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário. O evento foi realizado na maloca – construção tradicional, coberta de palha - da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn).
A ministra disse que a ação é uma prioridade para a garantia dos direitos dos povos indígenas. "Muitas pessoas, principalmente as indígenas, não têm o documento. Sem ele, fica mais difícil garantir direitos como a matrícula escolar e o Bolsa Família, entre outros”, explicou. A expectativa, de acordo com a Secretaria de Estado de Assistência Social do Amazonas, é atender a 1 mil famílias até o dia 18 de dezembro.
Dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Economia e Estatística (IBGE) indicam que é menor a proporção de registro civil de nascimento para a população indígena em relação às demais categorias de cor ou raça. Enquanto brancos, pretos, amarelos e pardos tiveram percentuais iguais ou superiores a 98%, a proporção entre os indígenas foi 67,8%.
O Censo de 2010 aponta ainda que o índice de subregistro é bem maior nas regiões Norte e Nordeste. De acordo com o levantamento, cerca de 600 mil crianças brasileiras com até um ano não estão registradas. Dessas, 182.610 estão na Região Norte e 200.384 na Região Nordeste.
Durante a abertura, dezenas indígenas, em sua maioria crianças, aguardavam o recebimento do registro. Entre elas, estavam Judite Lima de Souza, a filha Amanda de Souza e a neta Lana Manuelly. Dona Judite disse que só conseguiu retirar a certidão aos doze anos. "Foi só quando pude começar a estudar”, contou a indígena, que só conseguiu a certidão de nascimento da filha, quando a criança estava prestes a completar um ano de idade.
As duas estavam lá para garantir que a menina, que tinha acabado de completar três meses de vida, não passasse pelo mesmo contratempo. A certidão de nascimento de Lana Manuelly foi entregue pela ministra Maria do Rosário. "Eu acho que isso facilitou mais, antes a gente tinha que andar bastante até conseguir pegar o registro", disse Amanda, que mora em uma comunidade indígena nos arredores do município.
O evento também marcou o lançamento do Mutirão de Registro Civil e Documentação Básica para os moradores das terras indígenas do Alto Rio Negro. O trabalho também vai se estender até o dia 18 de dezembro nas comunidades indígenas de Pari-Cachoeira e Maturacá. No mesmo período, além do Alto Rio Negro, a ação será promovida nos municípios de Atalaia do Norte, Boca do Acre, Envira, Rio Preto da Eva, Novo Airão, Iranduba, Presidente Figueiredo, Manacapuru, Guajará, Ipixuna, Pauiní, Tonantins, Manaus e na comunidade de Santo Antônio do Matupi, em Manicoré.
A expectativa é atender a cerca de 5 mil pessoas durante o mutirão. "Desde 2009, nós estamos fazendo uma cruzada para alcançar todos os municípios e comunidades distantes das sedes. Para tanto, vamos utilizar barcos para chegar nessas comunidades para levar o registro civil e outros serviços", disse a secretária de Assistência Social do Amazonas, Graça Prola.
O registro civil de nascimento gratuito é um direito garantido pela Lei 6.015 a todo brasileiro. Ele é necessário para que o cidadão tenha acesso às políticas e aos serviços públicos. Sem o documento, as crianças ficam privadas de seus direitos fundamentais, como matrícula em escola e acesso a benefícios sociais. Sem registro, os adultos não podem obter a carteira de identidade, CPF e outros documentos.
O Brasil firmou compromisso com as Nações Unidade de reduzir, até 2012, o subregistro a 5% de crianças com até um ano de idade. Atualmente a média nacional é 6,6%. "Sabemos que ainda temos uma longa jornada para vencer o subregistro, mas a nossa determinação é enorme”, disse a ministra Maria do Rosário.