Em 24/10/2012 às 12h30 | Atualizado em 27/07/2018 às 17h22
A sugestão de aumento de impostos feita pelo primeiro-ministro de Portugal, Pedro Passos Coelho, na Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2013 (a versão portuguesa do Orçamento Geral da União brasileiro) poderá não ser eficiente para ajudar Portugal a sair da crise econômica que afeta os países de circulação do euro, especialmente no sul da Europa.
O alerta é do economista João César das Neves, autor de mais de 15 livros e professor da Universidade Católica de Lisboa. De acordo com ele, a elevação de impostos (além de diminuir a capacidade de consumo das famílias, em tempo de desemprego e recessão) serve para alimentar o aumento das despesas públicas, um problema estrutural da economia portuguesa.
A proposta de elevação da carga tributária tem gerado críticas da oposição e dos movimentos sociais, além de desarticulações dentro da própria base aliada do poder e está sob risco de ser questionada pelo Tribunal Constitucional.
Segundo Neves, ano a ano (desde 1950) a despesa do Estado português aumenta. As únicas exceções foram os anos de 2011 (queda de 5%) e 2012 (a caminho de redução em torno de 10%), quando o país adotou medidas fiscais impostas pela União Europeia, pelo Banco Central Europeu e pelo Fundo Monetário Internacional (a chamada troika). “O orçamento que foi apresentado para 2013 arrebenta inteiramente com isso e diz que a despesa vai aumentar”, disse em entrevista
A proposta de governo prevê que as despesas públicas aumentem de 75,7 milhões de euros para mais de 78 milhões de euros (3%), gerando um déficit de 7,5 milhões de euros acima da receita total (70,5 milhões de euros), apesar do aumento de impostos.
Na opinião de Neves, a razão do problema é político. “Há forças públicas que têm poder e conseguem sempre travar a redução da despesa pública”, diz reforçando que as “muitas forças” vão desde funcionários do Estado até pensionistas. “São pessoas boas, normais e honradas”, ressalta para dizer que não é só o caso de corrupção. “São pessoas que fazem pressão política e os partidos precisam ganhar eleições”, diz ao salientar que, aparentemente justas e de caráter universal, as despesas são maiores do “que o país consegue aguentar”.
A elevação de impostos em Portugal tem gerado crítica em diversos setores da sociedade. O aumento da taxação é um dos motivos para a greve geral que os sindicatos e as centrais sindicais tentam mobilizar para o dia 14 de novembro (em sincronia com a Espanha e com a Grécia). A queixa é que, desde o início da crise e da intervenção da troika, a população já tem pago mais impostos. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (o equivalente português ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE), a carga fiscal atingiu, no ano passado, o registro mais elevado desde 1995 (33,2% do Produto Interno Bruto).
Apesar de criticar o aumento dos impostos (e a não redução das despesas), João César das Neves reconhece que o aumento da carga tributária é “justo” do ponto de vista fiscal, pois se dá nos impostos diretos, isto é, sobre a renda (Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares – IRS; o IRPF de Portugal); e não nos impostos indiretos (Imposto sobre o Valor Acrescentado – IVA; equivalente ao ICMS brasileiro), que todos consumidores pagam e são proporcionalmente mais onerosos para os mais pobres.
Para o economista, a única opção de Portugal é fazer a economia crescer e se tornar mais dinâmica. “A solução é o aumento da economia. Temos experiência disso, em 1978 e 1983 foi assim”, disse se referindo a intervenções que o país sofreu do Fundo Monetário Internacional (FMI).
O aumento de exportações e a entrada de capital estrangeiro (nos processos de privatização) podem ser bastante úteis para o crescimento. Ele não acredita, porém, que isso favoreça uma aproximação de Portugal com a economia brasileira. “O Brasil é tecnicamente o grande parceiro de Portugal, o nosso irmão, mas nunca é de fato. Não tem qualquer comparação com a Espanha e suas ex-colônias. A relação é mínima. Continuamos a ter uma diferença enorme entre a retórica e a realidade”, lamenta o economista.